sábado, 23 de fevereiro de 2013

Trabalhar corretamente é sinônimo de bondade, em que mundo estamos vivendo?





Em nossa era contemporânea, vivenciamos a infelicidade de notar um comportamento que causa uma certa estranheza: Hoje em dia trabalhar corretamente é sinônimo de boa índole e  de bom caráter por parte de quem executa fielmente sua função na sociedade. Mas, espere ai... Isso não seria uma obrigação que todos que exercem cargo remunerado tem de fazer seu papel de forma íntegra e honesta? Então por que vivemos nesse endeusamento de quem faz o que seria, quer dizer, o que é uma obrigação que deve ser feita?

Com o passar do tempo nota-se que alguns valores antes tidos como básicos da fundamentação social estão se perdendo. E o pior disso é que eles estão se perdendo sem deixar de existir, todos sabem que os valores morais e éticos existem e estão ai para serem cumpridos, entretanto, estão cada vez mais perdendo espaço para uma sociedade obsoleta e demasiadamente individualista e egocêntrica por consequência. Essa individualização do ser, apesar de trazer coisas boas, trazem majoritariamente prejuízos para uma grande parcela da população. Vamos exemplificar para que tudo fique bem mais claro do que já está: Quando tratamos de maneira diferente, individual cada pessoa em um mesmo departamento priorizamos a manutenção da hierarquia naquele ambiente, mas também enfatizamos e diferença de valorização de quem ali está presente. Isso ocorre na questão salarial, é de ciência da grande maioria de nós cidadãos que um médico obviamente ganha mais que um técnico em enfermagem ou até mesmo um enfermeiro-chefe, salvaguardando raríssimas exceções. Logo, presumimos quase que instantaneamente que a função de um médico em um hospital deve ser mais importante do que a de um simples enfermeiro, o que acaba sendo verdade, mais uma vez guardando poucas exceções. 


Contudo, o que seria dos médicos sem a presença dos enfermeiros no ambiente hospitalar? E o que seria dos enfermeiros sem médicos para dar o parecer sobre o tipo de cirurgia que um paciente que acaba de chegar no pronto de socorro deve ser submetido? Ou seja, cada um tem sua importância em sua determinada área de atuação, cabendo assim um pequeno julgamento de quem ganha mais do que quem de acordo com o grau de atuação no caso, até aqui tudo bem pois essa é a ordem normal das "coisas" das quais somos ensinados desde criança a entender e fazer parte desse sistema.

Não obstante, podemos então fazer uma breve conclusão: Que cada determinante no meio social tem sua importância desde que sua tarefa seja cumprida de forma idônea, correta, justa e honesta. O fato de João ganhar mais que Pedro por ele ser médico não significa somente pelo fato de João ter feito medicina e Pedro não, mas sim pelo fato de que a função desempenhada pelo João é ligeiramente mais importante que a de Pedro em relação ao fator de risco das situações que ocorrem no Hospital, enquanto um enfermeiro participa de forma indireta a ação, é o médico que exerce o papel de agente ativo de tudo, sendo muitas das vezes o responsável pela manutenção da vida dos pacientes na mesa de cirurgia.

 Por tanto, o médico ganha mais porque ele tem uma função de alto risco que admite quase que nenhum erro, ele deve sempre beirar a perfeição, afinal ninguém cai no bisturi já sabendo que vai morrer mas sim pela esperança de manter-se vivo.

E é ai que surge nosso probleminha. Se o paciente sai da mesa de cirurgia curado ele agradece de forma reverencial à pessoa que o salvou, no caso o médico, sendo que ele não estava fazendo nada mais que sua obrigação como operante da medicina, foi isso que ele disse em seu juramento durante a colação de grau. Tudo bem que isso também pode ser entendido como uma forma gentil e educada de agradecer ao responsável por conseguir te deixar vivo, mas há alguns que simplesmente inflam o ego quando são bem-sucedidos na operação feita. Entretanto, não sentem o oposto dessa felicidade toda, pelo menos aparentemente, quando falham e acabam sendo os principais causadores da morte de uma pessoa. Mas por que? Isso vai de cada um, é o bom e velho peso na consciência que acaba pesando somente em quem a tem, sendo assim somente nos bons exercedores da profissão, pois do mesmo jeito que existem os carniceiros, existem os que tem orgulho do que fazem, independentemente da área que exercem.


Pois bem, a partir do momento em que há reverência de forma exagerada, surge também a possibilidade de críticas tão exageradas quanto os elogios no momento em que o ser humano por trás do médico comete uma falha, o que é normal afinal todo ser humano está sujeito a falhar em alguma situação que muitas vezes não admitem que isso aconteça, mas que infelizmente acontece. E foi assim que surgiu a comoção nacional e a consequente onda de ódio contra a médica que está sendo investigada sobre a acusação de escolher pacientes para morrer em plena UTI. Agora vamos pensar um pouco: Em que consiste essa formação de raiva generalizada por tantas pessoas de vários lugares do País? Isso mesmo, pela "crueldade" da Dr.ª em aplicar a eutanásia sem o consentimento do paciente que hipoteticamente estaria em estado terminal. Mas como será que um paciente salvo por essa mesma médica pensa sobre o assunto? Será que ele manifesta a mesma raiva que o pessoal do País está manifestando? Ele por estar salvo não seria a prova de que essa investigação seria infundada?

Não estamos pensando na hipótese de tudo ser um mal entendido, já estamos apontando o dedo antes da hora. Mas e se ela estivesse de fato errada? E se ela realmente escolhesse quem iria salvar naquela UTI? E se ela não pudesse salvar duas pessoas ao mesmo tempo e tivesse que subitamente escolher quem salvar ou não? E se o preparo físico e mental da médica não estivesse suportando ver tanta gente sofrer sabendo que ela poderia abreviar tudo isso? E se? 

Tudo isso que estamos presenciando não passa de uma ação já esperada por parte da sociedade. Do mesmo jeito que ela sabe aplaudir de pé o que não deveria ser aplaudido com tanta irreverência, ela sabe puxar o tapete da cena antes mesmo dessa cena acabar, indícios são suficientes para isso. Falta paciência nos corações iludidos, falta valorizar o bom e velho casal da moral e ética, falta ver o ser humano como ser humano, falta diferenciar o erro da monstruosidade. E falta punir de forma severa aqueles que não fazem o exercício ao qual são obrigados a fazer, e sem permissão de recurso.

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